Se uma andorinha só não faz verão, um professor tampouco
Por
Rodrigo Baglini ·
8 de junho de 2021
— Bom dia, professor!
Lá vem Eunice com seu abraço apertado (quando podíamos dar abraços!)
— O senhor está bem?
Respondo com a mesma alegria que ela me recebeu:
— Sim, muito bem, melhor agora que eu te vi!
Eunice é a inspetora da escola e assim como todos os outros profissionais que compõem o colégio, ela representa a base da comunidade escolar.
Por muitas vezes ao referenciar a escola, centralizamos nossos olhares apenas aos professores(as) e, com isso, desconsideramos a grande malha que representa este espaço tão vivo que é a educação.
Assim como Eunice, temos os inspetores/monitores, coordenadores, diretores, seguranças, secretários, assistentes, pessoal da manutenção e, claro, professores.
A escola não é um ambiente simples e linear tal como alguns da sociedade pensam, sobretudo para aqueles que ainda acreditam viver na ilustração da escola do Carrossel a que assistimos na década de 80 na televisão. Nessa escola a professora tinha o “controle” da educação apenas por sua ternura. E, com receios da diretora, “lutava” pelos seus alunos(as). Pois é! O cenário da fantasia que se apresentou anos atrás infelizmente construiu-se no imaginário de uma parcela da sociedade para esses que se dizem “amantes” da educação, num modelo em que a escola era um espaço simples no qual qualquer um podia ser responsável pelo aprendizado das crianças.
A construção da educação feita por tabloides, programas de tv e marketing barato de educação acaba excluindo todos os outros profissionais que compõem a escola, tais como a querida Eunice que, por vezes, é atravessada pelos olhares cegos de alguns responsáveis e, pasmem! de alguns professores(as), mas jamais das crianças.
A educação é feita por afeto, por segurança, por partilha, por comida e, ressaltando mais uma vez, por muitos profissionais que diferente da maioria dos professores(a), ficam na escola 8h,9h,10h e constroem no território da educação seu verdadeiro lar!
15h30, hora da merenda! As crianças se organizam em fila, pois a tia Ruth já disse em alto e bom tom: – Crianças! Só comerá quem estiver na fila! É claro que todos irão se alimentar, mas a construção dos limites, sobretudo do respeito que a tia Ruth nos traz, é carregada de muito carinho e afeto, demonstrando toda a complexidade que existe na escola.
Quando não tínhamos a pandemia e vivíamos um ambiente real de educação, eu costumava me deslocar ao fim do pátio para apreciar com olhos de gratidão a condução da maestrina Ruth. Com apenas duas palavras organizava um exército de mais de 100 crianças sedentas por sua comida, pois é! Não se faz educação com uma andorinha apenas!
Exemplos assim, nos mostram o quanto é complexo o ambiente escolar e, principalmente, a construção dos processos de ensino e aprendizagem. O território escolar não é apenas a sala de aula com carteiras enfileiradas escutando a professora falar, pelo contrário, a escola é feita de territórios demarcados que a partir das diplomacias de uma educação democrática, se articulam.
O que seria de nós professores, se não existissem os sorrisos das inspetoras dando o bom dia para as crianças, se não houvesse aquele ajuste rápido em alguma prova feita pelas secretarias, se a comida não estivesse pronta no momento ímpar da molecada (hora do recreio!),se não houvesse aquela organização da sala feita pela tia Maria que trata a sala de aula com tanto carinho, mostrando para as crianças o exemplo de organização que deve haver não apenas na escola, mas em suas vidas!
Mas, Baglini, quem ensina não é o professor?
Não, meu caro, o professor é mais uma engrenagem da infindável “fábrica” de produção de cidadania, de conhecimento, de criticidade que é a escola! O aprendizado não pode ser resumido em apenas decorar os afluentes do rio Amazonas, bem como realizar toda e qualquer conta matemática de cabeça. O aprendizado é feito essencialmente por pessoas, por relações, por ternura, por afeto e isso, evidentemente, não pode ser construído apenas pelo professor!
15h39, estou terminando mais esse artigo e puxando a tela de meu computador, pois daqui a alguns segundos pegarei as crianças no pátio, após terem saboreado o alimento da tia Ruth, brincado com os bambolês da querida Eunice, e após isso, terem limpado suas mesas com a ajuda da tia Maria.
Que tal mandar uma mensagem agora para algum profissional de sua comunidade escolar?
"A tecnologia mais eficiente criada pelo ser humano não são as máquinas tampouco os meios super mega ultra powers digitais, mas sim o diálogo, uma ferramenta de uso simples, mas de grande potencial em conectar, ajudar, colaborar e principalmente, AMPLIFICAR! -"